Quando menos percebe, você já cruzou a linha.
Saudações, galerinha desocupada, tudo belezinha com vocês?
Não sei se vocês já sabem, talvez eu não repetido o suficiente, mas toda semana nós aqui do blog nos viramos para trazer à vocês algumas recomendações legais (nas nossas cabeças, é claro) do que fazer nos finais de semana — levando em conta, é claro, que você não tem nada melhor pra fazer que ficar jogando vídeo game em casa ou ir para um cinema com seus amigos.
E a indicação super-maneira dessa semana é o jogo Spec Ops: The Line, desenvolvido pela Yager Development e distribuído pela 2K Games, lançado em 2012 em versões para PC, Xbox 360 e PS3.
Em um futuro próximo, Dubai foi dizimada por uma enorme tempestade de areia, que acabou cortando todos os meios de comunicação da cidade e impossibilitando a fuga dos civis. Rebelando-se contra as ordens de seus superiores, o Coronel John Konrad mobilizou um esquadrão de soldados voluntários em uma missão de resgate em Dubai, mas o grupo logo perdeu contato com a base do exército norte-americano, e o caso foi dado como encerrado. Algum tempo depois, a exército recebe uma transmissão de Konrad direto de Dubai, e é aí que você entra na história. Na pele do Capitão Martin Walker, você e seu pequeno contingente de subordinados são enviados à Dubai com o intuito dar um fim à missão que o Coronel Konrad jamais conseguiu concluir. Ou pelo menos tentar...
Em pelo menos 90% do jogo, tudo o que você verá serão prédios e areia. Sim, meus caros, sua jornada terá como pano de fundo não muito além de areia e concreto. O que, a propósito, é totalmente plausível com a proposta do jogo, afinal, estamos em uma Dubai destruida por tempestades de areia fortíssimas. Ao contrário do que você deve estar pensando, aqui em The Line esse contraste entre areia e concreto não é nem um pouco ruim. Tanto os altíssimos prédios quanto as infindáveis dunas são elementos importantes do level design do jogo, podendo ser utilizados a favor ou contra o jogador. Aproveitando que já comecei a falar do visual do jogo pelo level design, infelizmente, este foi um quesito um tanto quanto mal aproveitado aqui em The Line. Grande parte das fases são bem genéricas, e raramente somos agraciados com um elemento novo. O uso da areia — que, como eu citei agora há pouco, tem uma certa importância no level design — nas batalhas foi uma ótima sacada dos desenvolvedores, mas que foi bastante subaproveitada, já que seu uso é permitido apenas em determinadas partes do jogo, e em algumas delas o próprio jogo te obriga a usa-la. Não sei se é um preconceito meu ou se é apenas a verdade, mas jogos de ação — principalmente aqueles que tem a guerra como mote principal — não costumam receber muita atenção na Direção de Arte. Poucos são os jogos do gênero que conseguem se destacar por fazer algo diferente, e creio que Spec Ops: The Line se encaixa muito bem nessa lista. Pode até parecer irônico ou doentio falar isso, mas a Dubai "pós-apocalíptica" de The Line é belíssima. Não importa pra que lado olhe, tudo o que você vai enxergar é areia e concreto, até onde a vista alcança. Os prédios acima da sua cabeça e as ruas vazias tomadas por areia, destroços e corpos dão um tom aterrorizante ao jogo. Não um terror de dar sustinhos ou coisas do tipo, mas sim o terror de estar sozinho no meio de uma cidade quase sem vida, com aquela sensação claustrofóbica de estar sendo engolido pelos arranha-céus; sem saber para onde ir ou o que fazer, ou o que esperar no próximo quarteirão (se é que eles ainda existem debaixo da areia). As pichações e graffitis de Spec Ops: The Line são elementos visuais que ajudam a complementar o contexto do jogo, mas que muitas vezes podem passar despercebidos pelo jogador. Quando estiver jogando, sempre que possível, pare por um instante e olhe para as paredes. Algumas delas terão verdadeiras obras de arte, que, à primeira vista, parecerão apenas desenhos bonitos, mas se você prestar bastante atenção verá que são protestos, muitas vezes parodiando a cultura e os costumes norte-americanos. Ao lado de muitos deles, estão acesas centenas de velas, cada uma representando uma vitima não só da tragédia, mas de tudo o que se sucedeu depois dela. Podem até aparecer elementos menores e sem importância, mas são detalhes como esses que nos pegam de jeito, e ficam guardados em nossas memórias por um bom tempo.
Quanto à jogabilidade, Spec Ops: The Line funciona muito bem, mas não traz nenhuma grande novidade consigo. The Line executa muito bem um subgênero dos jogos de Ação em Terceira Pessoa que veio ganhando bastante força ultimamente — principalmente depois da franquia Gears of War —, que é o Cover Based Shooter (em uma tradução livre, "o shooter de proteção"), que cria situações e conflitos em que o jogador tem que procurar um lugar para se proteger (daí o nome Cover Based) e de lá comandar um contra-ataque. Pode parecer um estilo de jogo bastante passivo, já que não permite que os jogadores mais ousados partam pra cima dos inimigos de uma vez só, mas o que se perde em ousadia se ganha em inteligência. Sim meu caro, diferente de outros shooters que estamos acostumados, Spec Ops: The Line demanda um avanço mais tático, mais calculado por parte do jogador. Você estará em constante-- aliás, constantemente não, isso é eufemismo. Reformulando: você SEMPRE estará em desvantagem numérica em The Line, e diferente de outros jogos do gênero, você e seus aliados são humanos, tendo uma barra de energia (o famoso life) bastante limitada, ou seja, você não é feito de aço. E aí que a jogabilidade Cover Based entra. É de trás dos muros, muretas e paredes que os seus contra-ataques vão vir. Com o pressionar de um botão, você ordena que o Tenente Adams jogue uma flashbang (granada de luz) no meio dos inimigos para distrai-los; com outro botão, você dá sinal verde para que o Sargento Lugo sente o dedo no gatilho e estraçalhe cabeça do inimigo escondido com um rifle sniper (sempre os mais perigosos). Ou, se a fase permitir — um dos poucos pontos fracos do jogo —, atire bastante nas vidraças do cenário, liberando uma verdadeira enxurrada de areia em cima de seus inimigos. Outro fator que merece sua atenção é a munição. Em Dubai, sua munição é bastante escassa, e o que falta pra você existe em abundância para os seus inimigos. Mais uma vez: sua munição é limitadíssima, portanto faça o máximo para cada bala valer a pena e não hesite em pegar as armas dos inimigos mortos ou trocar as suas por outras com mais munição. É algo chato, eu sei, principalmente quando você simpatiza com uma arma, mas é isso ou ficar sem balas no meio de um tiroteio recém iniciado e com seus companheiros à beira da morte. Isso aconteceu MUITO comigo, e acredite: não é nada bom. Quem já está acostumado com Mass Effect ou Gears of War vai conseguir tirar Spec Ops: The Line de letra. Como nem só de sol vive o deserto, The Line também põe o jogador em situações extremas, e que situação mais extrema — seguindo o contexto do jogo — que ser obrigado a lutar pela sobrevivência no meio de uma tempestade de areia? Nessas tempestades, a sua visibilidade diminui drasticamente, e o vento interfere ainda mais na trajetória das suas balas, forçando você a se aproximar muito dos seus inimigos para poder alveja-los. Perigoso, mas necessário. São nesses breves — porém belíssimos — momentos em que a jogabilidade caminha de mãos dadas com os gráficos, proporcionando momentos épicos de desespero e adrenalina.
Apesar de todos os pontos bons e ruins de jogabilidade e gráficos, Spec Ops: The Line brilha mesmo é na história. O plot inicial pode parecer meio xumbrega, meio batido para os dias de hoje, mas à medida que o roteiro vai se desenrolando, a história começar a mudar de figura. É muito difícil terminar Spec Ops: The Line vendo o jogo com os mesmos olhos você começou. A história começa de um jeito, te dando uma leve impressão do que você acha que encontrará dali pra frente logo nos primeiros minutos de jogo, mas conforme o seu avanço, o clima vai mudando, e as coisas vão tomando um rumo bem diferente do que você esperava no começo do jogo. Assim como o clima do jogo vai mudando aos poucos, os personagens também seguem o mesmo exemplo. Spec Ops: The Line nos conta uma história de deterioração, de apodrecimento do ser humano; do quão fácil é destruir o caráter, a integridade e a moral de uma pessoal e o quão sútil é esse processo. E é nesse processo que está a sacada-mestra de The Line. A mudança de comportamento e, posteriormente, de caráter dos personagens é sútil, mas facilmente perceptível para o jogador, seja por uma cena mostrada em uma custscene ou em alguns momentos do próprio gameplay. Spec Ops: The Line também lhe permite a honra de tomar decisões em determinadas partes do jogo, não naquele estilo "Aperte X para o Caminho A ou Y para o Caminho B", mas de um modo mais sútil, as vezes até imperceptível à primeira vista. As vezes um inimigo poupado ou uma negociação mal feita podem determinar o rumo que o Capitão Walker pode tomar na sua (leitor/jogador) jornada. Eu queria muito me aprofundar mais e mais sobre trama de Spec Ops: The Line, mas o sentimento de estar entregando um spoiler a cada nova linha escrita é fortíssimo, e pode acreditar em mim: você não vai querer nenhum spoiler de The Line.
Se tem uma coisa que eu elogio muito nessa geração (que está acabando) é a capacidade de contar uma história. Há 10 ou 20 anos atrás, não era possível contar uma história de magnitudes ambiciosas através de um vídeo game, mas sempre houveram aqueles que desafiaram as imposições a época, e mesmo com limitações enormes conseguiram nos puxar pra dentro de seus mundos. Tudo o que vemos hoje, todas as experiências que os vídeo games são capazes de nos proporcionar hoje, são frutos do pioneirismo das gerações passadas. O que isso tem a ver com Spec Ops The: Line? Não muito, talvez, mas achei que seria pertinente compartilhar esse meu pensamento — que só tomou forma depois de refletir bastante sobre Spec Ops — com vocês, meus queridos caros desocupados.
Voltando a falar de The Line, agora no âmbito sonoro do jogo, é impossível falar de história, personagens e de desenvolvimento destes dois últimos sem falar naqueles que emprestam suas vozes (e seus rostos, em alguns casos) para que esses elementos possam ganhar vida: os dubladores. A dublagem é um fator importantíssimo em Spec Ops: The Line, principalmente no desenvolvimento (acho que a palavra melhor seria degeneração) dos personagens. Como eu disse antes, a deterioração dos personagens é sútil, mas perceptível para o jogador, e por por perceptível eu também quero dizer audível. Sim, meu caro, audível. Em The Line, na maior parte das vezes, é pela voz que você entende o estado emocional e físico dos personagens, já que as animações faciais do jogo não são tão exploradas como em outros games. Uma simples mudança de entonação numa frase, ou uma palavra adicionada à ela não só pode como certamente mostrará o estado em que aquele personagem se encontra. Um bom exemplo é o Capitão Martin Walker, dublado pelo estrogonoficamente sensível, mediolválgel e inoxidável Nolan North, que nos primeiros momentos de jogo, ao abater um inimigo, fala "Kill Confirmed" ("Morte Confirmada"). Da metade para o final, acredito que isso não seja um spoiler, o Capitão passa a falar "Kill FUCKING Confirmed!" (algo como "Morte Confirmada, P*&%¨!"), com uma clara entonação de raiva e ódio. Os personagens secundários de The Line também são igualmente incríveis e cativantes, principalmente ao interagirem uns com os outros, resultando em cenas e diálogos excelentes. Destaque para o misterioso Radioman (o "Radialista"), dublado magistralmente por Jake Busey, que consegue unir a dublagem à trilha sonora do jogo.
A trilha sonora "interna" de The Line — e por interna eu me refiro às musicas compostas unica e inteiramente para o jogo — não foge muito do comum, mas ainda assim é muito boa, e extremamente viciante, diga-se de passagem. Mas o destaque mesmo vai para a extensa e bem composta playlist (a lista de musicas) do Radioman, um sacada genial da equipe de desenvolvimento do jogo que usa os auto-falantes presentes na cidade para transmitir as mensagens ácidas e provocativas do Radioman, que muitas vezes usa de suas músicas para ilustrar e construir situações. Muitos dos sues tiroteios, a propósito, serão regados ao som de um bom Rock'n Roll clássico, cortesia do Radioman.
"Lugo — Ei, vocês estão escutando essa música?"
"Walker — Quem se importa com música, continua atirando!"
Hora daquela boa e velha nota -> 9,0 / 10
Apesar de não trazer muitas inovações relevantes ao gênero, Spec Ops: The Line trás para nós, jogadores, não só uma história bem contada, visuais bacanas ou um estilo de jogo bem reproduzido, mas sim toda uma experiência à se viver, tendo como pano de fundo não um cenário físico propriamente dito, mas sim a mente humana. Mais especificamente a mente de uma personagem, mostrando que a linha entre certo e errado, bem e mal, sanidade e loucura; não está pintada no chão para que todos possam ver, e sim escondida debaixo das suas escolhas e decisões. E quando menos percebe, você já cruzou a linha de um lado para o outro. (BARBOSA, Breno. Blog Desocupado)
Valeu aí galerinha, obrigado pela atenção e até a próxima!
Por Breno Barbosa
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